Xeg tem 30 anos, mais de metade dos quais dedicados à cultura Hip-Hop. Faz rimas, vive da música e lançou o último trabalho em Maio.

                         

Freestyle: Xeg significa o quê?


Xeg: Não respondo a essa pergunta.



Há quanto tempo tiveste contacto com o Hip-Hop?


Há uns 20 anos. Estava no 5.º ano e tinha uns 10 anos. Naquela altura, cheguei a dançar breakdance na brincadeira, sendo amante da cultura Hip-Hop. Mas nunca treinei coreografias horas a fio.



O que fazes profissionalmente?


Sou professor numa escola primária e em dois centros educativos. Nas aulas de música ensino precursão, dança e coordenação do ritmo.



Gostavas de viver só da tua música?


Eu vivo da música. Se só vivesse da minha música sobrevivia, mas como alio o trabalho e a música que faço dá para viver melhor.



Em Portugal há possibilidade de se viver exclusivamente da música?


Só por alguns períodos de tempo, de resto isso só foi possível para algumas pessoas que se estabeleceram na carreira, nos anos 90. Há um fenómeno ou dois mas, no geral, os músicos em Portugal não vivem da música, a maioria sobrevive. 



No teu caso o Hip-Hop é teimosia ou amor?


É amor, mas chega a uma altura em que, como nunca fiz nada na vida que não tenha a ver com música, acaba por ser um hábito. As únicas coisas que sei fazer têm a ver com música. Eu não tenho curso superior de coisa alguma. 



 Já pensaste estudar? Música talvez…


Sim. 



A que conclusão chegaste?


Cheguei à conclusão de que, num dia destes, hei-de fazer esse complemento. Um dia hei-de voltar a estudar, para já leio umas coisas.



Qual foi a evolução entre Ritmo e Poesia até este último trabalho?


Ritmo e Poesia saiu em 2001, mas não foi feito nesse ano. Foi um apanhado do que fiz desde 1997. O álbum Conhecimento é mais maduro e deu-me imenso prazer fazer e o trabalho de remisturas foi uma brincadeira. Peguei nos sons que já tinha e fi-los à minha maneira.



O que te deu mais prazer?


Foram todos de formas diferentes. Mas o primeiro foi especial por ser muito genuíno, o grau de exigência era quase mínimo em relação a tudo e foi quase todo ele emoção.



Qual dos três tem mais de ti?


Todos. Talvez o de remisturas não tenha tanto, mas os outros têm todos muito de mim. 



E a sensação de trabalhar um projecto novo? A gravação, o estúdio...


Para ser sincero, não é a parte de que gosto mais e que me emociona. Gravar em estúdio é trabalho, não é criação. Quando estou em casa e faço uma rima, um beat ou descubro um loop isso, sim, mexe comigo e fico contente. Mas quando vou gravar ao estúdio é obrigação, já não é novidade, é só trabalho.



Os teus álbuns demoram muito a sair porquê?


Há sempre qualquer coisa que corre mal. Por exemplo, relativamente ao último álbum, a música mais recente que eu tenho tem um ano. Tenho músicas neste álbum que datam de 2006. E tinha outras tantas que nem pus. Durante estes últimos quatros anos não fiz só 15 músicas, fiz umas 30.



E concertos? A adrenalina do palco e da plateia…


Gosto. Quer dizer…, cinco minutos antes do concerto fico sempre muito enervado e com pensamentos pouco optimistas.



Lembras-te de algum concerto que tenhas gostado mais?


Gostei de um em Oeiras, aqui há uns anos. Lembro-me de um dos primeiros que dei no Barreiro que também curti. Mas inesquecível foi ter cantado na Zambujeira, no Festival do Sudoeste. Só cantei uma música, não foi concerto, mas foi no palco principal e o recinto estava cheio. Foram cinco ou seis minutos muito intensos.



Quais as tuas principais influências?


Muitas e nenhuma em especial. Eu não tenho o meu rapper preferido, tenho os 20 preferidos. Também não tenho a minha música preferida, nem tão pouco o álbum preferido. Ouço tanta música… E há coisas que não são comparáveis. Não se pode comparar um álbum de 94 com um de agora. Os rappers são diferentes. Ser um bom rapper naquela altura não é a mesma coisa que ser um bom rapper hoje. Não são melhores, nem piores… são diferentes.

  


Gostas de trabalhar com algum artista em especial.


A cena de trabalhar o rap com alguém é muito subjectiva. Porque é mais a cena do: toma lá o beat, vamos rimar nesta cena, faz a tua rima e siga. Quando chega a hora de gravar, cada um «cospe» a sua rima e já está. Não há interactividade no processo de criação. São apenas trabalhos individuais que, em dada altura, se juntam.



Como caracterizas o teu estilo de música?


Hip-Hop puro. 



Em relação às novas ferramentas de execução e divulgação dos teus trabalhos, a internet, por exemplo, qual é a tua opinião sobre essa ferramenta?


Trata-se de uma boa ferramenta em termos de divulgação, mas também é a maior responsável pela música não se vender. Não digo que se devia acabar com a net, nem nada disso. A internet é o progresso e não há nada a fazer quanto a isso. Mas, como artista, acho que o saldo é negativo em termos de vendas e de produção. Na net qualquer pessoa está em pé de igualdade com toda a gente. 



E isso é mau?


É péssimo. Um dos problemas do rap a nível mundial é a saturação. Toda a gente é rapper, sendo que a maioria nem cara tem, tem nicks e depois admiram-se porque é que não vendem. Não vendem porque não existem, são virtuais.



Será possível explorar alternativas para reverter a situação?


Não. A internet destruiu a música por completo. Os miúdos ouvem música porque os amigos lha passam, perdendo-se o critério de escolha. Não sabem os nomes dos artistas, não sabem o nome das músicas, nem tão pouco sabem o que é um álbum ou o que é um vinil. As pessoas da nossa idade são, provavelmente, as últimas que compram cd’s…



Achas que mais cedo ou mais tarde o cd vai acabar?


Sem dúvida que vai. É uma coisa que dá trabalho. Tens de comprar, tens de pôr no computador, passar para o MP3…, enfim dá muito trabalho. Há inclusive rádios para os carros que já nem vêem como o leitor de cd, vêem antes com a entrada para a pen do MP3. 



Todas essas ferramentas fizeram com que o rap mudasse?


Eu costumo dizer na brincadeira que quando a música vendia ninguém nos levava a sério. Agora estamos em alta em termos de cultura, numa altura em que as vendas da música em geral não sobem, estão sempre lá em baixo.



Qual é o papel do Hip-Hop na sociedade?


É igual ao papel que tinha quando comecei a conhecer a cultura. Não há mais pessoal de Hip-Hop que há dez anos. Até acho que há menos...  



Porquê?


Porque gostar da música Hip-Hop não significa que se pertença à cultura.





Como era o ambiente da cultura quando começaste? 


Havia vários movimentos em que as pessoas se encontravam, ouviam as mesmas músicas e trocavam cassetes. Dava-me com pessoal daqui de Porto Salvo, Microlância, D-Marz, Sagas. Também nos encontrávamos em casa do Sam quase todos os fins-de-semana, com o Valete, o NBC e o Sun Rise…



Tens saudades dessa altura? 


Tenho saudades desse tempo, mas isso não significa que não goste do que se passa hoje.



Conselhos para quem está a começar.


Façam boas rimas e ponham na cabeça que isto é sobre rimas. Quem fizer as melhores rimas e quem cantar melhor, safa-se. Não chega serem as melhores rimas do bairro ou da crew, isso não chega. Têm de ouvir o que está lá em cima e aprender, mas não podem ouvir com ouvidos que não ouvem. Isso é o pior.  



Há quem diga que o rap está demasiado comercial. E tu o que achas?


Se me perguntasses há 10 anos, respondia que sim. Mas hoje em dia o que é o comercial? O aparecer na televisão é comercial? Vender cd’s é comercial? Mas toda a gente que edita um cd tem intenção de vender esse trabalho. 



Então para ti não é desprimor para a essência do rap que exista um artista que venda os seus trabalhos e tenha exposição mediática? Ou ele deixa de ser underground para passar a ser comercial?


Eu já tive uma opinião formada sobre isso, mas as coisas acabam por deixar de fazer sentido. Antigamente diziam: «Isso não é real», mas dito por pessoas que sabiam o que estavam a dizer, estavam dentro do movimento e da cultura. Hoje em dia, se acusam algum rap de ser comercial, eu pergunto: Mas o que é que tu sabes de rap? O que é que tu conheces de rap? Que moral tens para dizer se isto ou aquilo é comercial ou underground



Mas tens noção de que há pessoas dentro da cultura que defendem que por uma música passar na MTV é comercial?


Isso sempre foi uma grande mentira que apareceu no início dos anos 90. O rap sempre existiu para vender. O objectivo do rap é fazer dinheiro para sair do bairro, sempre foi assim e quem o nega não sabe nada da história do rap.



O facto de se vender mais ou menos cd’s nada tem a ver com a essência do rap, é isso? 


O que quero dizer é que não podemos acusar um rapper por ele vender os seus discos. Por exemplo, eu nunca fiz teledisco na vida. Agora vou fazer dois e vou lançar o meu álbum. Imagina que vendo as minhas cópias todas e faço nova edição e ainda vendo mais, porque as coisas até me correm bem. Se eu estiver a ser comercial, então eu não quero saber. O meu rap não muda por isso. 



O que é que diferencia o rap underground do comercial?


Para mim, só há uma diferença. É estares a fazer o teu trabalho já a pensares estrategicamente se a cena vai vender ou não.


O que é para ti o rap?


rap é fazer rimas. A cultura do rap é fazer rimas cada vez melhor. 




E pode ser interventivo, político, educativo…?


Sim, mas o rap não é isso. Isso é o rapper. Se as tuas rimas falam disto ou daquilo, isso já não é o rap cultura, isso já é a pessoa, o rapper.  



Quando escreves o que sentes?


Não sinto nada de especial, mas do processo todo que envolve o lançamento de um trabalho é a parte de que mais gosto. Ultimamente só tenho feito ego trip que é o que me tem dado mais pica escrever. 



Qual é a faixa que gostas mais no teu novo álbum?


Gosto de todas senão não as colocaria lá. Neste trabalho tenho três ou quatro faixas de ego trip, uma ou duas mais politicas, dois history tales e mais uma ou duas faixas temáticas. Cada faixa tem características diferentes, mas gosto de todas da mesma forma.



Fala-me um bocado da tua faceta de produtor…


Gosto de produzir. No meu entender, o processo começa no dia em que vais comprar o disco para samplar. Eu valorizo muito as fontes e nos últimos anos só samplo de vinil, não samplo de cd nem de MP3. Talvez porque me dá um som muito característico.



Projectos para o futuro?


Acabei agora de lançar o meu último álbum e de gravar um clip promocional. Estou a fazer instrumentais com samples só de música brasileira e também já pensei que para a celebração dos 10 anos do Ritmo e Poesia gostava de o regravar com as mesmas rimas mas com outros beats…  



Essas são boas ideias! E vês-te a fazer rap daqui a 30 anos?


Com 60 anos ninguém faz rap… Bom, para já não penso em parar, mas também não sou muito de colocar metas e objectivos a alcançar.




Por: Cátia Viegas

Fotos: Rita Carmo


FREESTYLE/2009 

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