Teve o seu boom como EITH, o writer que mostrou os graffiti a três dimensões em Portugal. Seguiram-se as grandes produções em fames. Como ODEITH, cruzou barreiras com as anamorfoses, as esquinas ganharam vida levando assim o nome de Portugal ao Hall Of Fame dos Graffiti. O que se segue?

Freestyle: Como foi o teu contacto com o Graffiti? 

Odeith: Quando comecei a fazer graffiti não tinha noção que se chamava graffiti, não sabia os nomes que se davam, os tags, o bombing, etc…

Eu começei a fazer graffiti por ver na rua, não tinha contacto com mais ninguém, não havia revistas nem net a explicar como há hoje.

Começei por ver graffs do EXAS, depois descobri o hall of fame de carcavelos e também o da praia, começei a interessar-me mais e fui para a linha de comboio, aí conheci o RISKO e o CREYZ, foram os primeiros writers que conheci, isto em 96.



Nessa altura tinhas uma vertente mais bombing, diferente de hoje em dia…


Sim. Pintava muito na linha de comboio e na rua. Eu já tinha aquele instinto de espalhar o nome, criar o nome. Eu quando vi o fame de carcavelos, e para mim que gosto de desenho atraiu-me logo, tinha altas cenas dos francêses NCA , do WIZE, EXAS, OBEY, era uma parede cheia de cor. A primeira revista que comprei e ainda hoje tenho guardada era a HHC, hip hop connections, uma revista americana que tinha duas páginas de graff, eu comprava-a só por essas duas páginas.



A certa altura juntas-te ao WIZE, quando aconteceu isso?


Eu nessa altura já tinha uns bons fames mas ainda não me tinha juntado a outros writers.

Ele convidou-me para formarmos uma crew, era eu, o WIZE e o YOUTH. Isto foi na altura que acabaram as crews FDP e PRM. Foí aí que comecei a pintar mais noutros sítios e a conhecer mais a cena do graffiti. Nessa altura já tinha lido nalgum lado uma explicação dos nomes, o tag, o king, o toy…



Qual foi o teu primeiro tag?


O meu primeiro tag era uma parte de um dos meus nomes, depois disso taguei PRESS?? , ENTER, só depois desses comecei a tagar EYTH depois EITH e em 2003 juntei as duas letras e ficou ODEITH.



O nome ODEITH foi propositado?


Eith era a maneira que arranjei de dizer ódio sem o ter escrito em inglês porque aí iria haver mais, seria o hate da bélgica o hate de outro lado… e também não era eight.

Quando comecei a tatuar e quis dar o nome à loja não sabia que nome havia de dar.

Como já tinha algum nome do graff pensei, vou chamar Eith Tattoos, porque é mesmo o meu nome de artista de rua. Com o tempo chateava-me o facto de estar em Portugal e não ter o nome de uma loja em português. O Nome da loja entretanto mudou para Estúdio Eith e eu volto ao mesmo tempo a pintar outra vez com mais regularidade e não queria estar a pintar EITH e que o people pensasse que eu estava a fazer publicidade ao estúdio, como curtia ter a cena em português lembrei-me que juntando o “O” e o “D” dava ODEITH e curti bué.



O que é o graffiti para ti?


Essa pergunta é sempre díficil de responder, por exemplo eu não vejo uma tela como um graffiti, graffiti é espalhar o nome na rua. Naquela altura espalhei, agora posso não espalhar da mesma forma. Mas para mim é ver as ruas pintadas, certos sítios hall of fames, trains pintados. Acho que tudo é uma maneira de te manifestares, não acho que seja só uma dessas vertentes, tudo é válido para teres o teu nome up.

Como sempre vivi perto da linha sempre vi comboios pintados e ainda hoje curto ver e saber quem anda a pintar.



Consideras esse tipo de graffiti arte?


Eu considero arte com limites, eu ligo muito ao traço, ao estilo de letras, gosto muito de ver bombings bem dados. Também curto ver maluquices, saber que o bacano foi dar aquele roof ou o train no sítio mais arriscado. Mas sim, considero arte.



Em muitos dos teus graff´s fazes questão de deixar sempre uma mensagem, achas importante?


Acho que é bom nós sermos como um MC mas da parede. Se eu posso deixar uma mensagem porque é um sítio onde as pessoas passam e vão olhar, não vou fazer um por-do-sol, vou deixar uma mensagem que leve as pessoas a pensar, é como um outdoor. Mas a minha cena é mesmo fazer letras (risos).



Os teus trabalhos, sejam graffiti ou tatuagens, são muito elaborados. Tens algum curso de artes?


Em relação a isso houve uma coisa que me deixou triste. Na altura que começei a fazer as anamorfoses, vi escrito em muitos blogs que eu tinha aprendido a fazer graffiti numa escola de graffiti. Como é que eu vou explicar às muitas pessoas que leram isso, que isso não é verdade? Eu antes de começar a pintar trabalhei numa oficina de móveis e aos fins de semana ia fazer graff. E o meu jeito de pintar veio do graffiti. Já tinha exprimentado carvão e outras técnicas mas sinto que aperfeiçoei a minha pintura no graffiti. O primeiro quadro que pintei foi só em 2004 ou 2005. Eu quando fui para uma loja de tatuagens já foi por a pessoa ver as minhas cenas na rua, se ele achasse que eu não tinha jeito nunca me convidaria. Mas sinto que tudo se deve ao graffiti, fui aperfeiçoando a técnica.



Como surgiu a ideia para pintares as esquinas?


Isso foi um dia que eu estava com o NARK, foi a primeira vez que pintei com ele. Quando acabei a minha peça e dei uns passos atrás achei que se puxasse uma das peças para o chão talvez saltasse. Mas só quando tirei a foto é que me apercebi que dava mesmo a sensação que a peça estava a saltar. Tive vários meses sem pensar nisso. Um dia peguei numas madeiras e começei a fazer umas experiências, tive dois anos obcecado com isso, estava sempre a falar disso. Durante uns tempos o pessoal ia pintar umas fábricas e eu lá arranjava umas esquinas para pintar mas nunca naquela altura me passou pela cabeça que uns anos depois ia estar a pintar no CCB.



 


E o que sentiste como writer ao estar a pintar no CCB?


Talvez tenha sentido por momentos que foi bom um writer ter sido convidado para um evento daqueles, mas a minha sensação não foi essa. Porque apesar de ter tido a liberdade para fazer o que quisesse e poder pintar o meu nome, que já de si é estranho, pagarem-me para escrever o meu nome, lembrei-me da altura que começei as experiências, eu tinha de acreditar naquilo e ser persistente, até disse ao meu velho, isto tem de dar alguma coisa, o pessoal quando vir isto passa-se. Os directores do CCB a perguntarem-me se aquilo era com latas, estavam à toa com aquilo tudo, devem pensar que eu tenho altos conhecimentos de geometria mas não, isto foi tudo uma batalha.



Também participas no filme “A Esperança Está Onde Menos Se Espera” como surgiu o convite?


Essa é uma história bem louca, daquelas que só acontece uma vez na vida. Eles precisavam de alguém que fizesse uma borrada numa parede ali nos comandos da Amadora, como a escola onde o puto anda é a da Damaia e eles usam a parte de trás da escola como entrada principal era uma maneira de associar o campo de futebol à escola. Num dos dias chamaram-me para escrever o nome na parede e não acabar, como não me disseram o que era para escrever fiz um ODEITH, deixei só o “ODE” que o resto era para ser o puto a acabar. Noutro dia queriam que eu acabasse o graff, cheguei lá e deparei-me com uma grande produção, carris, máquinas. O realizador Joaquim Leitão, virou-se e disse-me “ hoje vamos fazer uso do seu nome”  e riu-se. Fiquei lá a ver a cena e estava a ouvir a gravação, e oiço o puto a dizer “não sabes o que está ali a dizer? O D ODEITH, odeio o mundo…” eu fiquei a olhar, pensei esta vai ficar para a história.



Esta exposição toda que tens tido também levou a episódios menos positivos.


Como writer já apareci em jornais e revistas e sempre tive comentários de apoio.

Quando meti os vídeos da anamorfose na net tive sempre o cuidado de pôr ODEITH Portugal, porque achei que estava na altura de pôr Portugal no mapa, tinha uma cena fixe.

Houve um dos vídeos que a Susan Farrel da ArtCrimes publicou no site e que em pouco tempo já tinha 70mil views. Isto foi em 2007 na altura que houve o boom por causa das esquinas, isso assustou-me. Comecei a ver o meu nome em todo o lado, tirei tudo o que tinha online, cancelei blogs, tirei videos, só em 2008 quando a Susan esteve cá em Portugal, na altura até dei aquele bye bye graffiti porque estava magoado até com pessoas cá em portugal por usarem o meu nome, ela enviou-me o mail a dizer “não deixes de pintar porque o que estás a fazer é muito bom para o graffiti”.

Isso deu-me força, voltei com os blogs com os vídeos. Hoje em dia já não ligo as cenas que se dizem mas na altura eu não estava preparado, nunca pensei que tivesse tanta exposição. 



Quem vê as tuas pinturas nem imagina que tu vives o Hip Hop, hoje em dia até já produzes uns beats…


Eu vivo o Hip Hop. Mas secalhar o facto de ter passado por sítios pobres, ver cenas na televisão que me marcaram e a maneira como os media usam as pessoas, isso tenha feito com que eu faça um quadro de uma maneira mais esquisita. Mas há mais factores.

Há mais de dez anos que sou tatuador, já fiz escorpiões e índios mil vezes, logo quando chego a um quadro quero fazer aquilo que nunca fiz por exemplo um gajo sem uma perna a contorecer-se na cama.

A questão de eu produzir é porque eu sempre pensei que se tens um trabalho deves ter um hobby. Se o teu trabalho for o mesmo que o hobby vais dar em maluco…Considero que vivo do graffiti nestes últimos tempos, por isso arranjei a produção como escape.



Tu tens muitos trabalhos feitos inclusive na Cova Da Moura, fala-nos disso.


Na cova da moura nunca ganhei dinheiro. Há dois tipos de graff que eu faço lá, o graff para o people que curte a onda de rap e tá lá no beco a fumar charutos.O outro é com intuito de colorir o bairro, e isso já é a pedido da mulher do moinho da juventude. De todos os sítios que já pintei nunca nenhum me senti tão confortável como na cova ou no 6 de Maio. As pessoas ficam te a venerar e é daí que vem a minha dica do rei do esgoto, porque é as pessoas dos sítios onde há menos posses que dão mais valor aquilo que faço.

Em relação a outros trabalhos, já fiz muitas coisas mas nem sequer as assino, não considero isso graff, às vezes até digo, é um trabalho de pintura mas feito com latas.

Sinto-me mal com certos trabalhos que faço mas seria uma burrice não aceitar, se sei usar as latas e ganhar dinheiro com isso, faço.



Como achas que está o graffiti e portugal?


Eu acho que está muito bom, sinto é que falta união. Há muita gente espalhada. Estive em Madrid e na Alemanha, não digo que seja como o graff na Alemanha mas é como o graff em Madrid. Eu gostava é que cada vez que há uma geração de writers ficassem uns quantos a pintar (risos). É pena porque passaram muitas gerações e de cada uma ficaram sempre poucos.



Falando em gerações, a tua crew é uma mistura de sangue novo e old school.


Ia, porque eu e o NOMEN já tínhamos a Crew e depois surgiu o VILE e a seguir o MOLIN. Tenho pena é de não termos tido a hipótese de fazer mais murais, mas temos vidas diferentes e nem sempre é compatível.



Porque não vemos mais bombings teus?


Eu já não tenho aquela coragem, às vezes vejo um spot fixe mas não tenho aquela pica de ir lá. Mas se acordo assim menos fixe e um maluco me disser “queres ir ali aquele sítio” eu vou na boa dar um panel ou dar umas chapas mas não é uma cena que eu faça obsessivamente. Vou dando as minhas cenas, mas gosto de ver gajos como o RISKO continuarem a fazer cenas, admiro essa coragem. Gosto de ver os putos novos que também andam aí a rebentar. O pessoal nem imagina mas eu estou sempre atento a essas cenas, vejo os tags, se um comboio passar eu olho logo para ver se está pintado, tenho esses instinto de procurar graffiti.



Que planos tens para o futuro?


Continuar a fazer o que estou a fazer, ir mais vezes ao estrangeiro. Tenho pena é de não pintar mais em Portugal, não ir mais vezes a outros sítios, há writers na guarda há writers em coimbra, gostava de ter disponibilidade para ir lá pintar.



Queres deixar alguma mensagem?


À Freestyle por me ter convidado, espero que a Freestyle ou outras revistas e eventos que surjam, surjam com força. O people deve dar apoio, se vês um evento e és convidado, eu falo por mim, mesmo que não seja para ganhar nada e eu saiba que a cena é fixe e ninguém está a ganhar milhões eu não me importo de pintar de borla. Os MC´s deviam pensar mais no graffiti, no ínicio o pessoal de graff escrevia hip hop nas paredes. Lembro-me em duma festa em 1998 que vieram umas bandas estrangeiras e os NCA pintar, até foi numa tenda de circo, não me lembro de mais nenhuma festa como aquela. Havia espaço para todas as vertentes. Devemo-nos apoiar mais.




Por: Martim Borges

Fotos: Gentilmente cedidas pelo artista


FREESTYLE/2009



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